sexta-feira, 24 de junho de 2011

Manuel Pinto, director das operações marítimas da Greenpeace: "A Greenpeace é um contrapoder importante"

Nascido em Portugal, veio aos sete anos para o Luxemburgo, mas foi na Holanda que a sua consciência ambiental despertou. Está na Greenpeace há 20 anos e já percorreu o mundo na defesa do ambiente. Manuel Pinto, director das operações marítimas da Greenpeace, acredita que a organização tem ajudado "a mudar as consciências".

"Em alguns países somos tão malvistos como a al-Qaeda", afirma o português que dirige as operações dos barcos da Greenpeace, ao CONTACTO. Manuel Pinto foi o convidado da Greenpeace-Luxemburgo para uma conferência em Esch/Alzette, que serviu para assinalar os 40 anos de existência da organização.

A política de independência da organização face "aos interesses instalados" fazem da Greenpeace um alvo a abater pelas "grandes empresas, que têm uma grande influência económica" e que não querem mudar o estado de coisas.

"Nós somos um contrapoder importante e temos contribuído para uma mudança na consciência ambiental das pessoas". Uma mudança que tem sido construída ao longo dos anos através de acções de campanha criativas e assentes numa abordagem não-violenta, a que a Greenpeace chama de media mindbombs (bombas mediáticas de alerta das consciências). "O nosso objectivo não é mudarmos de uma só vez o estado de coisas, mas sim alertar as pessoas para o que se passa".

Manuel Pinto já viajou pelo mundo inteiro. Participou em campanhas como a da Amazónia, onde esteve destacado entre 1998 e 2002. "Foi a mais arriscada de todas as acções de campanha em que participei. Andávamos em carros blindados, usávamos coletes à prova de bala e alguns colegas meus ( n.d.R.: que não pertenciam à Greenpeace ) foram mesmo assassinados".

Outra das campanhas que guarda na memória é a da Moruroa, contra os ensaios nucleares franceses naquela ilha do Pacífico Sul. "A Greenpeace reuniu apoio de particulares, que aderiram ao protesto, e que vieram com barcos juntarem-se a nós. Do outro lado estava o Estado francês com navios, submarinos, tropas e até a Legião Estrangeira".

CONTRA OS INTERESSES INSTALADOS

"O que é triste é que há maneira de fazer as coisas bem, mas a indústria não quer mudar".

Manuel Pinto insurge-se contra aquilo a que chama "os interesses instalados das grandes multinacionais" e defende que o papel da Greenpeace é lutar para que as grandes empresas cumpram os seus compromissos de preservação do ambiente. Para que a Greenpeace cumpra o seu papel tem que ser independente, acrescenta o português radicado na Holanda desde o início dos anos 90.

"É isso que põe muitos governos loucos, porque não conseguem controlar-nos". A independência face ao poder económico e político é a pedra basilar da actuação da Greenpeace, que luta muitas vezes de forma desigual contra os interesses instalados.

O despertar da consciência ambiental deste português de 46 anos, natural de Campanhã, no Porto, deu-se quando ainda frequentava a escola no Luxemburgo, mas foi nos Países-Baixos, "no ano do acidente nuclear de Chernóbil", que conheceu uma jovem que o inspirou a juntar-se à Greenpeace.

"JÁ NÃO TENHO RAÍZES NENHUMAS"

O dinheiro que levou consigo para a Holanda acabou em alguns meses, quando já trabalhava na Greenpeace como voluntário. "Fiquei na Greenpeace com um pouco de sorte", conta Manuel Pinto. Formado em electrotecnia, foi chamado para ajudar a resolver uma avaria num dos barcos da organização. A resolução do problema foi a sua porta de entrada na organização. "Nos primeiros anos, trabalhava nos navios, onde fazia a manutenção técnica". "A partir de 1994, comecei a coordenar as minhas primeiras acções de campanha. A primeira foi na Grécia". Desde então percorreu o mundo em diversas campanhas, e passou pela América Latina, Pacífico, norte de África, Rússia e Ucrânia, pelas Coreias e por diversos países europeus.

Em 2005, deixa o trabalho no terreno. "Agora sou responsável pela organização da logística das missões e sou eu quem decide que embarcação é usada, porque cada uma tem a sua especificidade".

"Já não tenho raízes nenhumas, depois de 20 anos a andar pelo mundo", lamenta. Por isso é que Manuel Pinto, embora sentindo saudades de participar activamente nas acções de campanha, fica agradecido por agora ter "mais um trabalho de secretária".

Manuel Pinto tem um filho de 21 anos, que vive no sul do Luxemburgo, e uma menina de 17 meses em Amesterdão, na Holanda, onde vive com a companheira. Os seus olhos brilham quando fala da filha. "Estou a tentar reconstruir a minha vida", confessa.

Irina Ferreira


Foto: Eric Brausch

Sem comentários:

Enviar um comentário