sábado, 31 de dezembro de 2011

2011 foi o ano do advento dos governos tecnocráticos sem mandato popular

A crise da dívida na Grécia e na Itália impôs em meados de novembro uma nova alternativa política assente na formação de governos tecnocráticos apoiados por uma maioria parlamentar, mas que não foram submetidos ao crivo prévio do voto popular.

Assim, a formação destes executivos poderá tornar-se numa fórmula tentadora para abordar a crise da dívida dos países da zona euro, apesar dos crescentes alertas sobre um “grave défice democrático” ou um “grosseiro desrespeito da vontade popular”.

No entanto, estes novos “gabinetes de transição” liderados por primeiros-ministros com relações privilegiadas junto do sistema bancário europeu, garantem o apoio no parlamento dos partidos tradicionais que estiveram envolvidos nas negociações com a troika internacional (Comissão Europeia, Banco Central Europeu e Fundo Monetário Internacional).

Na Grécia, o antigo governo maioritário do PASOK de George Papandreou, no poder desde outubro de 2009, esforçou-se por cumprir as exigências dos credores mas não resistiu à crescente contestação popular e à decisão de realizar um referendo sobre o acordo de 27 de outubro sobre a Grécia, acordado numa cimeira extraordinária da UE.

Após uma agitada semana política, acabou substituído por Lucas Papademos, conselheiro económico do primeiro-ministro demissionário e conhecido no país por “senhor euro”, devido à sua função decisiva no processo de adesão da Grécia à moeda única, quando dirigiu o Banco Central da Grécia entre 1994 e 2002.

Papademos, que até 2010 assumiu ainda as funções de vice-presidente do Banco Central Europeu, lidera desde 11 de novembro um governo de “unidade nacional” que inclui o PASOK e duas formações da direita helénica (ND e LAOS).

Os líderes dos partidos envolvidos nesta solução que se pretende “transitória” – foram anunciadas eleições legislativas antecipadas para fevereiro – concordaram em assinar um compromisso por escrito sobre a aplicação do novo acordo com os credores internacionais.

O governo de Papademos foi incumbido de aprovar o orçamento para 2012 e ratificar o acordo de 27 de outubro, que prevê a redução de 50 por cento da dívida privada, com contrapartidas para a banca, e novas medidas de austeridade.

Mas tudo indica que o seu mandato poderá ser prolongado, um desejo que transparece em Bruxelas. O FMI já admitiu que o país pode precisar de ajuda até 2021 devido à espiral recessiva, mas manifestou indisponibilidade em negociar um aumento do seu apoio financeiro.

Evangelos Venizelos, o rival interno de Papandreou que manteve a pasta das Finanças no novo governo, já admitiu que a data das eleições permanece “flexível” e dependente dos progressos na aplicação do “plano de salvamento” da zona euro.

Mas ao contrário da Grécia, onde o novo governo de Lucas Papademos inclui três partidos, o novo executivo italiano de Mario Monti, antigo comissário europeu e que acumula a pasta da Economia e Finanças, é totalmente composto por tecnocratas sem filiação partidária e mesmo que também garanta, de momento, amplo consenso no Parlamento.

O sucessor de Silvo Berlusconi foi designado primeiro-ministro cinco dias após Papademos e esclareceu de imediato a sua missão: “salvar a Itália” de uma crise “muito grave” e que se “arrisca a comprometer o que foi garantido por pelo menos quatro gerações de italianos durante 60 anos de sacrifícios”.

O seu programa de governo inclui medidas de austeridade, aumento de impostos e os inevitáveis projetos de relançamento económico, que à semelhança da Grécia são sugeridos pelas instituições políticas e financeiras internacionais. Objetivo: reduzir a enorme dívida de 1.900 mil milhões de euros, 120 por cento do PIB, sobretudo após o aumento vertiginoso dos juros dez anos para a aquisição de títulos de dívida soberana.

A grande novidade foi o anúncio de um superministério do crescimento que reúne as pastas do Desenvolvimento económico, das Infraestruturas e dos Transportes, entregue a Corrado Passera, o patrão do segundo maior banco italiano, o Intesa Sanpaolo.

A direitista Liga Norte, de Umberto Bossi, tem-se destacado na contestação ao novo executivo, e quando o Parlamento e Senado se preparam para aprovar até ao Natal o “plano de rigor” que prevê uma redução do défice de 20 mil milhões de euros e medidas de relançamento do crescimento que rondam os 10 mil milhões.

Apesar de a data das eleições legislativas ainda não estar definida em Itália, aumentam as dúvidas sobre a capacidade de Papademos e Monti aplicarem ambiciosos programas de austeridade e de relançamento num espaço temporal muito limitado.

Os novos primeiros-ministros da Grécia e Itália já foram confrontados com as primeiras greves e protestos à escala nacional convocados pelos sindicatos. As próximas semanas vão revelar a sua capacidade de resistência parente as novas e anunciadas vagas de agitação social, num 2012 que se prevê muito turbulento.

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